segunda-feira, março 23, 2020

Ensaio sobre o amor - 2 - Prólogo


Prólogo

                A azinhaguense sentia a repulsa de quem está na linha, com as costas no frio muro, prestes a ser fuzilado pelo esquadrão da morte das SS de Hitler, a não ser que ceda à chantagem do seu carrasco. Apetecia-lhe fugir, mas não tinha como nem para onde. Havia uma escolha a executar. Olhou o pai de frente, como o forcado que olha o touro prestes a investir. Os olhos não libertavam apenas lágrimas. Libertavam dor, raiva, ódio daquele homem que estava em frente a si. Inspirou fundo com tranquilidade dissimulada; avançou.
            - Então, minha menina… - dizia o pai - …como vai ser? O que escolhes? – o tom de voz era o de um tirano – Tens essa criança e vais educa-la, dizendo-lhe que o pai fugiu, e não regressas a Azinhaga do Ribatejo, nunca mais, ou vamos tirá-la daí de dentro e vou levar-te ao Convento de São Francisco de Bragança?
            Aquela pergunta já havia sido repetida mais de uma dezena de vezes nos últimos quinze minutos. Limpou as lágrimas.
            - Eu vou ter o meu filho e educá-lo.
            - E prometes não voltar a Azinhaga nunca mais?
            - Prometo… - fez uma pausa.
            - Prometes o quê? – questionou rudemente.
            - Prometo não voltar a Azinhaga. – disse.
            - E mais o quê?
            - E dizer ao meu filho que o pai fugiu.
               
                O ambiente dentro daquela divisão era tenso.


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